“Das Dores — Opereta favelada”, foi inspirado nas histórias de mães como Jacklline Oliveira, de Kathlen Romeu, e Bruna Silva, de Marcus Vinicius da Silva Ao subir uma escada em caracol até o mezanino do Teatro do Sesc, em Copacabana, em Na Zona Sul, o espectador fica de frente para o enorme painel à direita da pequena sala de concertos. Estão expostas 16 fotografias de vítimas da violência policial nas favelas, como Kathlen Romeu, Thiago Menezes Flausino, Marcus Vinicius da Silva e Johnatha de Oliveira Lima. Camisetas penduradas com imagens impressas de alguns desses jovens completam o quadro e a certeza de que o público verá um drama da vida real no palco. A peça “Das Dores — Opereta favelada”, escrita por Marcos Bassini e dirigida por Renata Tavares, funciona como um grito de justiça para as mais de 20 mães cujas histórias estão tecidas na criação do texto. Conexão Brasil-França: jovens músicos de orquestras cariocas embarcam em apresentações inéditas na Europa Falsa comunicação: descubra que punição pode ser aplicada a um homem que mentiu sobre arrastar um suposto ladrão pela janela do carro — Para escrever o drama, entrevistei mães durante a visita a Redes da Maré, organização que protege os direitos dos moradores. Também conversei com eles em sessão especial na Alerj, que buscou pôr fim às operações policiais que vitimaram menores — disse o autor. O drama musical que se desenrola em palco, em formato de opereta, conta a história de Maria das Dores. A personagem, que coloca um pedaço de vidro no próprio pescoço e ameaça se matar em rede nacional se o Estado não revelar quem foi o responsável pelo assassinato do filho, não retrata nenhuma mãe específica da vida real. Na verdade, é uma mistura de diversas mulheres que passaram pelo mesmo problema, o que acaba fazendo com que muitas mães que passaram pela mesma situação se identifiquem com o que estão vendo. Entenda: Conflitos na Avenida Brasil preocupam as motoristas cariocas Jacklline Oliveira, mãe de Kathlen, e Bruna Silva, mãe de Marcus Vinicius Hermes de Paula Sem esquecer É o caso de Jacklline Oliveira, 43 anos, que estava na plateia no dia da inauguração, em 18 de julho. Ela é mãe de Kathlen Romeu, filha única que estava grávida do primeiro neto quando foi morta, aos 24 anos, após levar um tiro de fuzil. A jovem, que era designer de interiores, voltava de uma visita à avó, no Complexo do Lins, na Zona Norte, no dia 8 de junho de 2021, e se deparou com uma operação da PM na comunidade. Na época, a polícia afirmou ter retaliado um ataque de bandidos. Jacklline acredita que a peça pode ajudar a garantir que casos como o da filha, que ainda aguarda a punição dos culpados, não sejam esquecidos. — É a arte a nosso favor. A peça inteira é um manifesto. É um grito de dor e um pedido de ajuda. Ajude-nos a denunciar e combater esse racismo que de forma cruel e covarde ceifa vidas – diz a mulher, que vê no interrogatório dos dois acusados do homicídio, marcado para o dia 12, uma esperança de que, finalmente, a punição possa ocorrer , depois de longos três anos de espera. — Espero que fiquem sentados no banco dos réus e percam os uniformes. Não quero vingança, só quero justiça. Assista ao vídeo: Foragido da justiça é encontrado pela polícia escondido debaixo de um sofá, em Barra Mansa Também aguarda justiça Bruna Silva, 41 anos. Embora veja o programa como um aliado, ela está tentando encontrar coragem para assisti-lo. Ela teme não conseguir resistir à emoção de ver seu drama retratado no palco. A moradora do Complexo da Maré viu seu filho Marcus Vinicius da Silva, de 14 anos, ser morto durante uma operação policial, no dia 20 de junho de 2018, quando frequentava a escola. A mãe fez da camisa do uniforme furada e manchada de sangue do filho sua bandeira de batalha. — Nenhum dos envolvidos foi punido. Não sei o nome de nenhum policial que participou daquela operação, mas alguém tem que assumir a responsabilidade — exige a mãe, que ainda aguarda indenização do Estado, determinada pela Justiça em dezembro de 2021, nos valores de R$ 100 mil e R$ 35 mil, a serem pagos aos pais e avós do adolescente, respectivamente. Houve apelos de ambos os lados. Reajuste de pedágio: Via Lagos custa R$ 30,20 nos finais de semana e RJ-116 também tem nova tarifa; confira A dor de terem perdido os filhos da mesma forma trágica acabou unindo Jacklline e Bruna, que não se conheciam. Hoje, ambas são ativas em movimentos de mulheres que enfrentam o mesmo drama. Para contar a história de Maria das Dores, parecida com a delas, além da história das mães na vida real, a produção conta com artistas que conhecem bem essa realidade, do grupo de teatro Entre Lugares Maré. Das 25 pessoas envolvidas na produção — entre atores e equipe técnica — 80% são negros e moram na comunidade, a maioria da Maré. O perfil é o mesmo das vítimas retratadas no palco, como mostram pesquisas como a divulgada pelo Instituto de Segurança Pública (ISP) em meados de 2021. No palco, o drama de Maria das Dores, que perdeu o filho baleado pela polícia durante uma manifestação, ganha ainda mais verdade ao incorporar frases da boca de mães da vida real. “Um negro nasceu com um alvo preso nas costas”, o que é frequentemente dito por Jacklline e repetido por um dos personagens no final da peça, é um deles. O funk “Quilombo Favela Rua”, de Mano Teko, que se tornou uma espécie de hino para essas mães e que traz no clipe oficial imagens de mulheres que perderam seus filhos para a violência policial, encerra a peça. Herança: Justiça nega pedido de validade de testamento que beneficiou irmãos e sobrinho de vencedor da Mega-Sena assassinado — Acho que essa peça “Das Dores” só poderia ser feita por pessoas que moram ou trabalham na favela. Ou não teria esse tamanho, essa carga emocional, de verdade e de propriedade. Embarcamos nesse desafio que foi bastante doloroso para todos nós — destaca Renata Tavares, atriz e diretora premiada, moradora de Bangu que há 13 anos dá aulas de teatro na Maré, local onde Mila Moura, de 28 anos, que desempenha um dos papéis centrais, vivido até há um ano e meio. “Das Dores” fica até o dia 11 no Teatro do Sesc, em Copacabana, onde tem apresentações de quinta a domingo, a partir das 20h30. A diretora de produção Vanessa Greff afirma que a exposição deverá ir para outros espaços, mas primeiro passará pelo Museu da Maré, em apresentação à comunidade. ‘Sem problemas, não!’: vídeo de entregador ‘repreendendo’ em inglês viraliza nas redes sociais O que dizem as autoridades Sobre o caso de Marcos Vinicius da Silva, a Polícia Civil informou que a investigação está em andamento na Delegacia de Homicídios da Capital (DHC) e é monitorado pelo Ministério Público. “Foram analisados laudos periciais e entrevistadas testemunhas”, diz a nota. Em relação à indenização à família, o governo do Estado informou que aguarda a definição do valor e acrescentou que as investigações sobre o caso estão em andamento. Sobre a morte de Kathlen, a PM informou que o caso está sendo conduzido pelo Ministério Público de Auditoria Militar, e acrescenta que os policiais envolvidos na ação permanecem afastados do serviço de rua e suspenderam o porte de armas.
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