agosto 23, 2024
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Ensino integral faz diferença em desempenho de alunos mais pobres | Brasil

Ensino integral faz diferença em desempenho de alunos mais pobres | Brasil
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A educação integral predominou entre as escolas secundárias estaduais de menor nível socioeconômico e com melhor desempenho no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Das cem escolas com esse perfil e com melhores resultados no Ideb 2023, 78 são integrais. A participação de 78% está bem acima dos 32,4% de participação plena no total de escolas estaduais de ensino médio consideradas mais vulneráveis ​​na classificação socioeconômica.

O resultado é destacado em levantamento do Instituto Sonho Grande com base em dados do Censo Escolar 2023 divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Para Ana Paula Pereira, diretora executiva do Instituto Sonho Grande, os dados mostram que o modelo abrangente tem potencial para impulsionar a educação pública brasileira, melhorando a aprendizagem de alunos de menor nível socioeconômico.

“A educação integral representa cerca de um terço das escolas com baixo nível socioeconómico e tem uma taxa muito mais elevada, de quase 80%, entre as escolas mais vulneráveis ​​e com melhor desempenho. Isso mostra que o integral está gerando mais aprendizagem e não é porque o integral está com mais frequência em escolas vulneráveis”, afirma Pereira. Ela explica que as escolas com ensino integral têm distribuição geográfica no país semelhante àquelas com ensino regular.

As famílias que mais se beneficiam do benefício integral são as mais vulneráveis”

-Maria Slemenson

A pesquisa mostra ainda que no ensino médio estadual, o ensino em tempo integral tem melhor desempenho no Ideb do que o ensino regular em todos os níveis socioeconômicos.

A maior diferença, 0,5, está no nível II, onde o ensino regular tem índice de 3,7 no Ideb 2023 e o ensino de tempo integral tem índice de 4,2. Nos níveis III a VI a diferença é de 0,4, sempre com o integral com melhor desempenho (veja tabela abaixo).

A classificação considera o Indicador de Nível Socioeconômico (Inse) 2021, o mais recente, construído a partir de questionários respondidos por estudantes no âmbito do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb). O Inse combina a educação parental e a propriedade familiar de bens e serviços. Quanto mais baixo for o nível, piores serão as condições socioeconómicas dos estudantes. Na pesquisa que mostra o desempenho por nível do Inse, foram consideradas 9.761 escolas estaduais de ensino médio, sendo 2.419 escolas de tempo integral. As escolas dos níveis I e VII foram desconsideradas por não representarem um número significativo da amostra.

“O que se pode concluir do resultado de 2023 é que o delta de aprendizagem da prova mostra um ano a mais de matemática, por exemplo, para quem estudou no ensino integral”, diz Pereira, referindo-se à diferença de desempenho do indicador Ideb entre estudantes regulares e em período integral. “Se considerarmos que o ensino médio é composto por três anos de estudo, um ano a mais de aprendizado é relevante.”

A classificação que indica participação de 78% de alunos efetivos entre as 100 escolas com melhor desempenho de baixo nível socioeconômico considerou escolas até o nível III. No Inse 2021, havia 16,1 mil escolas estaduais de ensino médio com o indicador socioeconômico divulgado. Destes, 3.500 – ou 21,7% – são considerados de baixo nível socioeconômico, estando o Inse até o nível III. Neste universo, 1.100 – ou 32,4% – são integrais. No total, são 20 mil escolas na rede estadual de ensino médio.

Segundo o Inse 2021, no nível III, a maioria dos alunos respondeu que tinha em casa geladeira, televisão, banheiro, wi-fi e máquina de lavar, entre outros bens. A escolaridade da mãe, pai ou responsável variou desde completar o quinto ano do ensino fundamental até o ensino médio.

“Os dados mostram que a questão do nível socioeconómico e das regiões mais vulneráveis ​​é mais que um desafio, é uma grande oportunidade. Essas regiões, essas famílias e comunidades são as que mais se beneficiam do programa integral”, afirma Maria Slemenson, superintendente de políticas educacionais para o Brasil do Instituto Natura. Ela destaca que 75% das escolas secundárias completas estão localizadas em regiões com níveis socioeconômicos de II a IV.

Integral não é apenas uma extensão da carga. É preciso renovar o modelo de ensino”

-Ana Paula Pereira

Slemenson chama a atenção para a evolução do Ideb para o ensino médio público nos últimos sete anos, que aumentou 0,6, passando de 3,5 em 2017 para 4,1 em 2023. Para ela, a expansão do ensino em tempo integral contribuiu para esse desempenho.

A pesquisa Sonho Grande mostra que em 2023 18,1% das matrículas do país no ensino médio estadual eram em período integral. Em 2019 era de 10,1%. Em 2023, as escolas abrangentes atingiam 33,2% do total de escolas secundárias estaduais. Em 2019 era de 13,3%. A pesquisa Sonho Grande considerou escolas de tempo integral aquelas que possuem pelo menos uma turma que oferece ensino presencial com 420 minutos ou mais de aulas diárias, sem incluir atividades complementares.

A disparidade entre a participação das escolas de tempo integral no número de matrículas e das escolas, explica Pereira, ocorre porque as escolas de tempo integral tendem a acomodar menos alunos do que aquelas que seguem um turno regular. Há também, diz, escolas que estão na transição gradual para o tempo integral e que ainda têm parte das aulas de forma regular. Um número menor de escolas oferece ensino integral e regular.

Slemenson observa que a expansão do ensino em tempo integral nos últimos anos ocorreu principalmente a partir de 2017, quando foi publicado um decreto do governo federal que serviu de incentivo ao ensino médio em tempo integral. A meta estabelecida no Plano Nacional de Educação (PNE) é ter 50% das escolas públicas com ensino em tempo integral, para atender pelo menos 25% dos alunos da educação básica.

O fato de uma em cada três escolas de ensino médio da rede estadual oferecer o curso completo mostra o alcance cada vez maior dessa política pública, avalia Pereira. Mas ela destaca que a situação entre os estados é muito heterogênea, pois cada governador escolhe suas prioridades na educação e as políticas que considera mais adequadas.

Segundo o levantamento, o Piauí possui 85% de escolas públicas de ensino médio abrangentes, seguido pelo Ceará e Pernambuco, com 70%. Em Santa Catarina a participação é de 1%. No Rio Grande do Sul a alíquota é de 10% e no Maranhão e Mato Grosso, de 13%.

Um dos desafios do avanço da educação integral, diz Pereira, é a entrada do aluno no mercado de trabalho. Pesquisa já realizada com alunos do ensino médio público do país mostra que entre 5% e 6% trabalham porque precisam, cita. “Pouco mais de 20% ingressam no mercado de trabalho em busca de independência financeira. É justo que o aluno tome essa decisão. O que defendemos é tentar mostrar ao aluno o benefício de estar na escola integral, porque há maior aprendizagem de português e matemática. A investigação mostra que os diplomados a tempo inteiro auferem posteriormente um rendimento mais elevado e têm maior probabilidade de aceder ao ensino superior, para além de outras vantagens e benefícios que são alcançados a longo prazo.”

“E para os estudantes que precisam trabalhar para ajudar em casa, temos visto políticas governamentais, tanto dos estados quanto do governo federal, para apoiar financeiramente esses estudantes, o que acolhemos bem”, diz Pereira. Há estados, diz ela, com programas específicos voltados para estudantes em período integral.

Outro desafio para a expansão da integral, diz Pereira, é a operacionalização. “O tempo integral não é apenas uma extensão do horário de trabalho. No total são pelo menos sete horas de aula por dia e, idealmente, nove horas por dia, modelo que tem apresentado melhores resultados. Mas não pode ser mais do mesmo”, observa Pereira. “É preciso renovar o modelo pedagógico, um modelo centrado na vida do aluno, para que o aluno seja protagonista, envolvido nas decisões docentes e possa compreender seus pontos fortes e como a escola se conecta aos caminhos que pode seguir. Não são coisas simples de fazer e é preciso também fazer com que os professores vejam a escola de forma diferente.”

“Oferecer educação integral não significa necessariamente aumentar significativamente os gastos do Estado com educação”, destaca Slemenson. “As pessoas têm a visão de que tudo duplica [em despesa, na migração para o integral]. Não necessariamente. Uma reorganização da rede poderia oferecer muitas oportunidades para colocar mais estudantes em tempo integral e obter eficiência de custos.”

Os Estados são actualmente obrigados a afectar 12% e 25% das suas receitas fiscais à saúde e à educação, respectivamente. No debate sobre esta ligação, alguns governantes e especialistas defendem a unificação do mínimo obrigatório, com 37% das receitas destinadas às duas áreas, mas sem definir uma parcela específica para a saúde ou a educação. A ideia tende a preocupar quem acompanha mais de perto a educação.

Para Slemenson, a educação no país ainda precisa de muito investimento. “Não podemos recuar nem correr o risco de chegarem menos recursos. Estamos comemorando esse momento em que o Brasil se recuperou da pandemia. Parece que há uma boa posição para continuar crescendo nas próximas edições do Ideb, mas estamos muito longe das metas estabelecidas.”

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